Apela-se à filósofa alemã Hannah Arendt sempre que um ato
maligno choca a todos por sua brutalidade e carece de explicação para ser
entendido, o que não significa normalizado.
Foi ao escrever sobre o julgamento do oficial nazista Otto
Adolf Eichmann”, um dos organizadores do Holocausto, que ela cunhou uma
expressão que ficaria famosa – a “banalização do mal”.
Arendt concluiu que o mal praticado por ele não era
demoníaco, mas um mal constante, parte da rotina dos oficiais nazistas como
instrumento de trabalho. Ele cumpria ordens.
Durante o julgamento que o condenaria a morrer enforcado,
Eichmann dizia, e de fato acreditava, que seguia o certo, o governo e as leis
do Estado, e que por isso era inocente.
O homem de 25 anos que assassinou à machadinha e a facadas 4
crianças numa creche de Blumenau, em Santa Catarina, e feriu 5 disse à polícia
que cumpriu ordens de outro que o ameaçou.
Parece mais razoável que tenha agido sob o estímulo do
discurso do ódio, da intolerância e do preconceito que a extrema-direita
propaga abertamente nas redes sociais, e não só no esgoto delas.
Mentes doentes não racionalizam. Confundem violência com
coragem. Os que se sentem marginalizados e injustiçados pela vida que levam são
presas fáceis do desejo de vingança.
É previsível que haja novos ataques a creches e escolas pelo
país. O efeito imitação é poderoso. É tão certo como esperar que nos Estados
Unidos, a essa hora, um atirador esteja matando a esmo.
Levantamento da Universidade de São Paulo registra que 22
ações violentas contra unidades de ensino aconteceram no Brasil desde 2002 –
metade delas de 2022 para cá. Total de mortos: 40.
O celular já foi um artefato inocente. A internet, um meio
que daria voz aos que não tinham voz, aproximando as pessoas e as incentivando
a se entenderem; um ideal do paraíso.
Enquanto as redes sociais não forem reguladas, e se
dependerem dos seus donos jamais serão, elas continuarão servindo de pasto
viçoso para alimentar os instintos humanos mais viscerais.
Não basta regulá-las. Nem apenas cobrar dos governos medidas
de reforço à segurança pública. É preciso que caia a ficha da sociedade e que
nos mobilizemos para enfrentar a banalização do mal.
Mais educação. Mais saúde. Mais renda para quem tem pouca, o
que quer dizer menos desigualdade. Mais rigor na venda de armas. Mais mão
pesada da justiça no julgamento de crimes bárbaros.
E fé. Sim, acreditar que ainda é possível a construção de um
mundo melhor. Sem esperança, só andaremos para trás.
Blog do Noblat
07 de abril de 2023